Capítulo 10

Claire acordou cedo no sábado para ir até uma ONG em Wimbledon que tinha encontrado pela internet. Ela havia visto diversos cachorros e gatos e ficou muito empolgada com a ideia de encher o apartamento com bichos. Combinou com seu pai de ir até lá. Ela comprou uma casinha de transporte para cachorros e uma outra para gatos. Chamou seu pai para que não carregasse tudo sozinha no metro e no trem que iria pegar para chegar até lá.

Pontualmente às 8 horas da manhã, o pai apertou a campainha e foi ao encontro da filha. Ela havia preparado um café da manhã bem reforçado para os dois tomares juntos. Enquanto levava colheres de iogurte com passas na boca, Claire sentiu vontade de perguntar ao pai, o que havia acontecido entre ele e Jane no último domingo.

– Papai, posso lhe fazer uma pergunta?

– Claro, todas as perguntas que quiser, filha. – Disse Steve, sorrindo enquanto passava geleia de amora em um pedaço de queijo brie.

– Você e a mamãe… Domingo passado. O que aconteceu para terem quebrado a tigela do molho? – Claire foi direto ao assunto e Steve ficou sem saber o que responder por alguns segundos. Mas logo sorriu e ficou um pouco tímido.

– Eu tentei beijá-la. – Steve disse.

Claire quase cuspiu o iogurte que estava em sua boca e se engasgou, começou a tossir sem parar e ficou sem conseguir respirar. Steve se preocupou e correu para o outro lado da mesa para levantar os braços da filha e erguer sua cabeça, para que ela parasse de tossir e voltasse a respirar, pois já estava vermelha. Claire não tinha acreditado no que havia acabado de ouvir e se engasgou quando pensou em dar uma gargalhada. Aos poucos, ela foi voltando ao normal e Steve olhou a filha, enquanto ela bebia um gole de suco de frutas vermelhas e olhava para ele com cara de deboche.

– Você tentou beijar a mamãe? – Ela repetiu a frase dele.

– Você tem que admitir que ela estava linda com aquele vestido branco! Como ela emagreceu. – Ele olhou para xícara de café e bebericou um gole, enquanto Claire o olhava com a boca aberta, incrédula. – Ora Claire! Eu sempre fui apaixonado por sua mãe!

– Então por que a deixou ir embora? Por que não a segurou para sua vida? Não houve nada além de brigas e desgaste para que vocês se separassem. Vocês dois não quiseram lidar com os problemas que um relacionamento longo, inevitavelmente tem! Pareciam duas crianças! – Claire estava dando um sermão no pai. – Nunca entendi a raiva que os dois sentem um pelo outro, porque não houve traição, não houve agressão ou qualquer outra coisa que pudesse provocar essa raiva. Sempre achei que fosse charme de ambas as partes. – Steve deu risada.

– Talvez seja mais fácil admitir que sentimos raiva um pelo outro, do que dizer que ainda nos amamos. – O velho Steve estava com olhos brilhando e Claire sentiu pena do pai.

– São 10 anos de separação. Há 10 anos vocês estão separados e desde então, eu conheci… – Claire ficou em silêncio enquanto fazia uma conta mentalmente – 8 namoradas, papai! OITO! – Claire deu risada e Steve também. – Por que não tenta fazer as coisas diferentes agora? Está sozinho. Por que não tenta enquanto não arruma outra mulher para lhe aquecer. O inverno está chegando.

– Ahh filha. Doce ilusão pensar que depois de todos esses anos, nós iríamos nos tolerar novamente.

– Não vão saber se não tentar. – Claire bebeu um gole de seu leite com chocolate e Steve estava pensativo. – Papai, a mamãe namorou com apenas um homem depois do divórcio. Ela sempre fala do senhor com raiva. Mas lembre-se que a linha que separa o amor do ódio é muito tênue. Tenho certeza que ela pula de um lado pro outro o tempo todo. Como sempre fez.

– Eu sei… Eu também fico pulando essa linha o tempo todo. – Eles riram.

– Mas… Me diga uma coisa. – Claire fez cara de menina levada. – Rolou um beijo? Ou ela derrubou a tigela primeiro? – Claire gargalhou e viu as bochechas do pai ficarem coradas. – Me conte! Não me esconda nada, senão serei obrigada a jogar esse pedaço de bolo na sua cara. – Claire pegou um prato que tinha um pedaço de bolo de laranja e ameaçou o pai, que dava risada.

– Não nos beijamos, Claire. Ela se assustou com minha aproximação e deixou a tigela cair. Mas… – Steve levantou o dedo. – Tenho certeza de que iria conseguir beijá-la se não tivesse acontecido isso.

– Hum… Acho que preciso marcar mais almoços e jantares aqui em casa. Reunir todo mundo e eu mesma cozinhar. Aliás, papai! Vamos logo para a ONG, pois não posso voltar tarde. Tenho ainda que passar no mercado porque tenho que fazer um almoço hoje.

– Vai cozinhar para quem? – O pai perguntou, se levantando com um prato e uma xícara na mão, indo em direção à cozinha.

– Para um amigo. Na verdade, para um futuro astro da música inglesa! – Claire sorriu e disse as palavras com um grande orgulho, pois não iria aceitar algo que fosse menos que isso para Alex. Ela queria transformá-lo em um cantor de sucesso e sabia exatamente a fórmula mágica para fazer isso. Esse era um dos motivos por ser conhecida pelo mundo todo como uma das melhores headhunters.

– Entendi. Você sempre está cercada desse tipo de pessoa. – Disse o pai da cozinha e em poucos segundos voltou para a sala de jantar, para ajudar Claire a guardar tudo. – Vai acabar encontrando outro homem, que lhe dê mais valor do que aquele compositor chato.

– Matthew era um bom namorado, papai. – Claire se levantou e também começou a guardar tudo que estava na mesa.

– Se fosse um namorado bom, estaria aqui com você. Ele pode fazer o trabalho dele em qualquer parte do mundo! – Steve estava sério.

– Eu sei. Também acho isso. – Claire mordeu os lábios. – Mas não quero falar dele papai, desculpe.

– Tudo bem. Vamos logo para a ONG, quero te ajudar a escolher os bichinhos.

Claire estava feliz por ter tido aquela conversa com o pai. E já estava bolando planos em sua cabeça, para conseguir deixar os pais sozinhos novamente e também para que eles voltassem a se entender. Ainda não tinha nada concreto em mente, mas com certeza iria arranjar algo bom.

E também já estava pensando o que iria preparar para Alex para o almoço. Seu coração bateu forte e ela estava ansiosa para que a hora passasse rápido. Queria se encontrar logo com ele.

***

– Meu Deus! Quantos filhotes lindos! – Disse Claire, olhando através de um portão, para uma local da ONG que havia dezenas de filhotes brincalhões de cachorros. – Não vou conseguir escolher nunca. – Ela se abaixou na frente do portão e quase todos os filhotes vieram para perto, para tentarem conseguir um pouco de carinho dela. Fato que a fez dar muita risada.

Claire sempre gostou de animais e desde pequena colecionava resgastes de bichinhos de rua. Certa vez, ela tinha por volta dos 12 anos de idade e já tinha dois gatos e um cachorro em casa. Voltando do colégio, ela viu um gato branco de olhos azuis em cima de uma árvore, miando sem parar. Não pensou duas vezes. Pegou o gatinho de cima da árvore com todo o cuidado e o colocou no chão. O gato ficou tão feliz com ela, que começou a ronronar e passar entre as pernas dela, fazendo aquele charme clássico de gatos. Ela se encantou com o bichano na mesma hora. Pegou-o no colo e o levou para casa, para desespero de seus pais.

– Papai! Me ajude a escolher. Talvez o mais quietinho, pois ele terá poucas chances de ser escolhido, porque os outros sempre passam na frente dele. – Ela olhava para os filhotes que estavam na parte do fundo da sala. Até que viu um filhotinho preto, deitadinho apenas olhando a bagunça que todos os outros estavam fazendo. Ele abanava o rabinho, mas com certeza não queria se envolver naquela bagunça tremenda. – Olha aquele pretinho ali, papai! – Ela apontou para o filhote sorrindo e Steve também sorriu. – Ele parece perfeito!

Em poucos minutos o filhote estava no colo de Claire, que conversava com ele e o levantava para o ar, enquanto a mulher preenchia a ficha de adoção.

O setor de gatos ficava do outro lado da rua. Então Claire, seu pai e o filhote que ela havia dado o nome de Thor, foram até lá. Ela gostava da história e do filme do super herói, e a mulher que lhe doou o cão, disse que ele poderia ficar grande, pois era cruzamento de Pastor Alemão com outra cachorra sem raça. Thor era lindo e era só Claire olhar para ele, que seu rabo se movia freneticamente de um lado para o outro.

Ao chegar ao setor de gatos, pediu para que o pai esperasse do lado de fora, pois os gatos poderiam não gostar da presença de um cão lá dentro.

Ao contrário do cachorro, ela queria um gato já adulto, de mais ou menos 2 anos. Entrou numa sala cheia de gaiolas, cada uma com um gato dentro. Olhou para todos, um gato mais lindo que o outro. Até que viu uma gatinha branca de olhos azuis que parecia muito o gato que resgatou da árvore quando era criança. Não teve dúvidas e escolheu por ela.

A gata ficou confortável em seu colo e já estava ronronando para Claire. Sinal de que a doação tinha sido aprovada pela felina também, que recebeu o nome de Kissy.

Então Claire voltou para casa com Thor e Kissy. Seus dois novos amigos, para uma nova vida. Ela queria que tudo fosse novo naquela fase. E realmente tudo era novo. Novo e com gosto de felicidade.

Steve e ela voltaram no metrô brincando com os peludos através da grade da casinha de transporte que Claire havia comprado.

No dia anterior, depois que saiu do trabalho e antes de ir ao pub com Tiffany, ela passou em uma loja especializada em artigos de animais de estimação e comprou tudo o que precisava. Ração, tapetes higiênicos, brinquedos, cama para os bichinhos dormirem e um grande arranhador para gatos.

Kissy estava se mostrando uma gata extremamente amorosa e Thor um filhote brincalhão, latindo alto de dentro da casinha, provocando alguns risos dentro do metrô.

Quando chegou em casa, pediu para que o pai olhasse os bichinhos por alguns minutos, pois ela precisava ir até o mercado perto de sua casa. Pequeno, mas que vendia muitas frutas e verduras frescas. Além de uma diversidade de comidas de várias partes do mundo.

Encontrou tudo o que precisava para fazer o risoto, a carne vermelha e a salada que queria fazer para o almoço com Alex. Queria caprichar, pois não sabia se ele se alimentava adequadamente. Seu coração se apertou ao pensar que em dias de pouca doação de dinheiro com sua música, ele poderia ir dormir passando fome. Ou pior, passando fome e na rua.

Ela balançou a cabeça. Não queria pensar nessas possibilidades, pois isso só aumentava sua vontade de agarrar Alex para sempre, para sua vida. Tinha certeza de que poderia estar se apaixonando por ele e sentiu que toda essa sensação, era boa demais para ser irreal.

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