Capítulo 6

A casa de Armand estava borbulhando. Muitas pessoas chegando, muitos carros em fila e absolutamente todo mundo estava de máscaras. De dentro do carro, Sophie estava observando e já imaginando que seria uma festa interessante, pois teria que adivinhar onde seus amigos e conhecidos estariam. Seria difícil encontrar alguém com todas aquelas máscaras. Mas até que Sophie gostava dessa ideia, pois era bem parecido com o que ela fazia todos os dias praticamente. Se esconder.

– Boa festa, Sophie. – Disse o motorista ao chegar na frente da casa de Armand.

Ela agradeceu e deu uma gorjeta a ele. Um rapaz abriu a porta do carro e ela desceu. Estranhamente, ela estava se sentindo uma mulher bonita, sensual e poderosa. Caminhava com segurança, segurando sua pequena bolsa prata. Ao chegar na porta, já estavam distribuindo as bebidas de boas vindas. Uma taça de champagne da melhor qualidade. Sophie já pegou a sua e continuou caminhando, observando. Havia uma banda tocando músicas alegres, a decoração da casa estava toda festiva. Ao longe, Sophie viu um rapaz alto e pela maneira que ele segurava seu copo, ela sabia que era Armand. Poderia ir até ele para conversar também, mas preferiu ficar longe.

Ficou observando tudo e sorrindo, pois era como se todos estivessem sozinhos, mesmo estando com outras pessoas. Cada um estava confinado dentro de sua máscara, protegido de todo o resto do mundo. Era uma sensação que Sophie gostava bastante.

Olhou ao seu redor e até que conseguia identificar algumas pessoas. Até que seus olhos se cruzaram com outros olhos. Um rapaz alto a observava a apenas alguns passos de onde ela estava. Ele sorriu para ela, ela meio que o ignorou e se virou, se sentando em um sofá, fora de toda bagunça, bebendo seu champagne. Atitude esperada de Sophie.

O rapaz estava encantando com a máscara de Sophie e com a beleza e elegância de seu vestido. Ele também estava sozinho e sentiu que precisava falar com ela. Criou coragem e se aproximou de onde ela estava sentada. Sentiu que precisava falar com aquela mulher.

– Com licença, posso me sentar ao seu lado? – Ele perguntou. Ela o olhou e apenas deu de ombros. Ele se sentou e ficou olhando para a frente por alguns segundos. – Você também está achando que essa festa pode ser um marco na vida de todos nós? – Ele iniciou a conversa com essa pergunta e ela ficou pensando.

– Estou achando divertido. Pois vejo muitos usando máscaras quando estão com seus rostos limpos. E talvez essas mesmas pessoas hoje, não estejam usando essas máscaras, apenas aproveitando o fato de estarem escondidos para mostrar quem realmente são. – Ela concluiu e o rapaz deu risada.

– Mas veja pelo lado bom. Até você poderá usar esse benefício. – Ele sorriu mais e ela levantou as sobrancelhas. – É bem fácil, se quiser pode treinar comigo. – Ele sorriu novamente e Sophie o olhou através da máscara. Seus olhos se cruzaram e ele tinha belos olhos azuis reluzindo entre aquela máscara preta que ele usava. – Ora, não fique desconfiada. Sou um completo estranho para você. Pode me dizer o que quiser. – Ele a incentivou a começar a falar.

– Vou começar dizendo que… Seus olhos são muito bonitos. – Sophie sentiu seu coração se aquecer, pois jamais em sua vida havia elogiado um homem assim com tanta clareza e tão direto. Ela ficou sem saber o que fazer e voltou a beber seu champagne, enquanto o rapaz ficou rindo.

– Não sei, mas tenho a ligeira impressão que talvez essa seja a primeira vez que elogia alguém do sexo oposto. – Ele disse rindo e ela o olhou entortando os lábios, entendendo a provocação dele.

– Isso, você jamais saberá. – Ela disse entre dentes, mas logo deu risada e ele a acompanhou.

– Posso dizer o mesmo de você. – Ele fez uma pausa. – Seus olhos também são muito bonitos. Aliás, eu sempre preferi os olhos verdes aos olhos azuis como os meus. Verde é muito mais enigmático, forte como a cor da natureza.

– Isso é o que você diz. – Ela voltou a beber seu champagne, dando de ombros.

– Como você se chama? – Ele perguntou.

– Quem sabe algum dia, a gente se encontre sem máscaras e você me reconheça. Aí terei o sinal que preciso para saber que devo dizer meu nome a você. Até lá, pode me chamar de Mademoseille Vert. – Ela esticou sua mão para que ele a beijasse. Ele rindo segurou sua mão e cheirou sua pele. Ato que provocou um arrepio quente em Sophie. Ele beijou sua mão delicadamente e voltaram a se olhar.

– Já posso dizer algumas coisas sobre você somente de cheirar sua pele da mão.

– Vamos lá. Diga. Se você acertar…

– Você é uma artista. Com certeza pinta quadros incríveis, mas pelo seu jeito, deve esconder todos eles. Também fuma e com certeza, deve ser a pessoa mais charmosa do mundo fumando. Imaginando que seja uma artista e que esteja aqui nessa festa do Armand, já posso dizer que você vai ao Café Guerbois ou outro local, quase todas as noites, beber vinho e dar risada com seus amigos. Mas nada disso consegue te deixar feliz, pois você tem uma tristeza no olhar que parece ser permanente… – Ela estava quieta, apenas o olhando, séria. – E claro, com o glamour que você tem, seus vinhos favoritos são de Bordeaux. – Ele fez uma pausa. – Errei algo?

Sophie não sabia o que dizer. Jamais pensava que era uma pessoa tão previsível que um estranho qualquer pudesse dizer tudo aquilo, somente ao cheirar sua mão.

– Você acertou precisamente cada palavra. – Sophie disse, se levantando. Sentiu que precisava ir embora e que seu disfarce tinha sido descoberto.

– Onde você vai? – Ele perguntou se levantando também. E a segurou pela mão e eles se olharam. – Eu não conheço você. Não sei quem é. Não faço ideia do que disse. Mas foi o que me veio na mente para dizer. Me desculpe se passei de algum limite que você não está acostumada a deixar que passem. Gostaria muito que continuasse comigo essa festa. Prometo que serei um bom parceiro. Por favor… – Ele levantou as sobrancelhas e ela revirou os olhos. – Seja minha companheira essa noite. Somente essa noite. Dois estranhos se divertindo como se já se conhecessem.

Ela pensou por alguns segundos, mas no final concluiu que não iria perder nada. Olhou para sua mão junto com a desse rapaz desconhecido e entrelaçou seus dedos nos dele. Sorriram um para o outro e ele se aproximou dela, colocando sua outra mão em sua cintura e tentou se aproximar para lhe dar um beijo. Ela se inclinou para trás e colocou um dedo nos lábios do rapaz.

– Nem pense nisso! – Ela disse.

– Me desculpe. É que seus lábios são lindos.

– Faça por merecer. Pense que eu estar aqui, ao seu lado e segurando sua mão, já é um grande feito. – E realmente era.

– Não tenho dúvidas. Vamos pegar algo para beber e dançar um pouco.

Ele a puxou pela mão e foram buscar mais champagne. Sophie estava totalmente desarmada para aquele estranho com olhos azuis tão lindos. Continuaram conversando sobre a festa durante um tempo. Até dançaram e ela se deixou conduzir. Surpreendendo até a si mesma, pois sempre achou que nunca saberia dançar. Depois de um tempo, o rapaz estava cada vez mais envolvido por ela, e ela também.

– Vamos tomar um ar lá fora? – Ele perguntou. Ela assentiu. E foram de mãos dadas ainda, até lá fora. Sophie passou por uma mulher de máscara e teve certeza de que era Gertrude. Mas com certeza ela jamais reconheceria Sophie, pois ela estava de mãos dadas com alguém. Sophie sorriu.

– Nossa! Está muito quente lá dentro. – Sophie disse, mexendo em sua bolsa para pegar um cigarro.

– Quantos desse por dia você fuma? – O rapaz perguntou.

– Não sei. Depende do meu humor. Se quero festejar, fumo alguns. Se quero esquecer, fumo todos. – Ela deu risada.

– Quer me contar o que tanto você quer esquecer? – Perguntou o rapaz, sentando no muro da varanda da casa de Armand. Ela o olhou tragando seu cigarro e respirou fundo. Pensou alguns segundos e decidiu encarar o papel de desconhecida.

– Perdi meus pais em um acidente de barco, alguns anos atrás. 10 anos para ser mais exata. Desde então, tudo mudou. Não consegui mais ser a mesma. – O rapaz assentiu e entendeu.

– Eu também perdi uma pessoa muito importante em minha vida, há pouco tempo. Sei bem como é essa sensação de vazio. É uma dor que você dorme com ela e acorda com ela. Incessante e impossível de ser esquecida. – Ele disse.

– Exatamente assim. – Ela tragou de novo. – Quem você perdeu? – Perguntou Sophie.

– Minha esposa. – Sophie sentiu um arrepio correr pelas suas costas e imaginou que aquela dor, era enorme também. – Ela era jovem, mais jovem do que eu. Linda, com longos cabelos loiros e os olhos mais alegres que já vi. Mas ela se foi há alguns meses e eu voltei para Paris. Para cuidar dos meus pais e dos negócios. Londres não estava mais fazendo sentindo para mim.

– Ela era inglesa? – Perguntou Sophie, delicadamente, tendo a sensibilidade de que aquele assunto era tão frágil quanto o seu.

– Sim. Nos conhecemos na minha faculdade e foi um amor louco desde o começo. Nos amávamos como ninguém e em pouco tempo já estávamos casados. – Ele olhou para fora, para o jardim da casa e respirou fundo. Sophie sentia que aquele rapaz estava se abrindo verdadeiramente. – Cada segundo que passamos juntos foi como um paraíso na Terra. – Ele olhou de volta para Sophie. – Você já sentiu isso alguma vez na vida? – Sophie sorriu sem mostrar os dentes.

– Não cheguei nem perto de amar assim. – Ela concluiu. – Mas, no fundo, bem lá no fundo, mas bem bem beeeem beeeemmm lá no fundo, – eles deram risada – acredito que um dia sentirei. Vocês tiveram muita sorte em se encontrar. Ela foi um capítulo lindo em sua vida, mas tenho certeza de que você foi a vida dela. E foi exatamente isso que ela levou de você. Somente amor.

O rapaz sorriu e concordou com a cabeça, sem dizer nada. Sophie voltou ao seu cigarro e ficou pensando que ali estavam duas pessoas que precisavam lutar para colar os pedaços de seus corações que haviam sido despedaçados. Todos os dias.

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